Minoria cristã ‘garimpa lixo’ em busca de ascensão social no Egito

Minoria cristã 'garimpa lixo' em busca de ascensão social no Egito

Minoria cristã ‘garimpa lixo’ em busca de ascensão social no Egito

Coptas veem na reciclagem chance de crescer economicamente em meio à discriminação religiosa e social; comunidade representa 10% do povo egípcio

É o cheiro nauseante e adocicado que te atinge primeiro, vindo da mistura de papelão molhado e frutas podres. Ele se mistura aos gases de emissões de veículos e ao odor da areia quente enquanto seguimos viagem por uma autoestrada do Cairo. Estamos na Cidade do Lixo. Para alguns egípcios, porém, esse é o cheiro do sucesso.

Nosso táxi trafega pelas ruas do Egito, seguindo um caminhão que parece sofrer para transportar sua carga de caixas de papelão compactadas. Imagens de Nossa Senhora, Jesus e de santos decoram as fachadas de lojas e varandas de apartamento. Resíduos de sacos plásticos, papel alumínio e jornais voam com o vento, misturados à poeira urbana.
Por trás das muralhas desse subúrbio do Cairo está uma comunidade de cristãos coptas, a religião de apenas 10% dos mais de 82 milhões de egípcios. Aqui, eles são conhecidos como os Zabaleen – um termo derrogatório para definir catadores de lixo.
Eles se estabeleceram em uma pedreira abandonada e, desde os anos 70, coletam o lixo no Cairo de graça, trazendo-o para casa para reciclar. A triagem é feita à mão – o plástico é separado do papelão, o tecido do material orgânico – antes de tudo ser vendido para o próximo estágio da “indústria do lixo” que sustenta a comunidade.

O material é pulverizado, derretido e compactado até que sobre somente material orgânico em decomposição, que serve de alimento para porcos mantidos em conjuntos habitacionais do local – e cujos grunhidos ecoam do alto dos prédios.
A Cidade do Lixo, por sinal, é um dos poucos lugares do Cairo em que se pode comer carne de porco na rua – o Egito é um país onde o islã é a religião oficial.
Hoje, dia 9, as ruas estão vazias, porque é domingo. A igreja, construída em uma caverna, realiza uma missa assistida por cerca de 4 mil pessoas – bem menos que os 20 mil que se aglomeram no local em datas mais significativas do calendário cristão.

As ruas também contam com o que parece uma espécie de camelódromo: sobre tapetes, há um festival de panelas, pratos, taças de champanhe e talheres de prata. Mas não são bancas. O guia explica que nenhum dos itens está à venda. “Esses são os presentes de casamento de uma noiva. Ela os deixa na rua para mostrar aos vizinhos o quão ricos são”.
A Cidade do Lixo é um lugar de oportunidades. Os Zabaleen estão entre os melhores recicladores do mundo, e o aumento da demanda mundial por materiais reciclados fez com que novas empresas surgissem no local. O local abriga uma série de homens jovens em ternos de grife e relógios caros. Alguns desses jovens empreendedores têm diplomas, mas, na maioria dos casos, a combinação de educação básica e uma conta bancária já resolve.

Se a posse de terras é algo complicado em termos legais, os rumores são de que, na Cidade do Lixo, o metro quadrado sai pelo equivalente a R$ 3.600.
A reportagem localiza o carro de Adel antes de o encontrar – um modelo esporte laranja em meio às ruas empoeiradas. Ele está apenas de passagem. Deixou a Cidade do Lixou para morar em um condomínio de luxo do Cairo (áreas com nomes de cartão postal de cidades ocidentais, como Beverly Hills e Hyde Park), mas seus negócios ainda estão aqui.
Ao abrir a porta de seu armazém, ele aponta para uma espécie de roda de plástico verde, tão grande como uma pessoa. “Fui o primeiro a comprar essa máquina aqui. Ela transforma garrafas plásticas em espirais de encadernação. Agora, recebo lixo do Egito inteiro”, explica.

Outra máquina produz um cubo perfeitamente prensado de metal, composto de latas de refrigerante compactadas. Adel vende seus produtos reciclados ao redor do mundo. Sua filha está matriculada em uma escola particular de renome do Cairo ele é sócio de um ilustre clube da cidade. Mas a vida não é muito segura: contratos internacionais de reciclagem dependem de estabilidade e consistência, atributos que hoje estão escassos no Egito. Socialmente, a posição de Adel é precária. A comunidade se sente discriminada. “Não tenho vergonha de ser Zabal, mas espero que minha filha encontre outra carreira”.
Fonte: Último Segundo/Mundo/BBC BRASIL


Tags: ,

Não encontrou o que queria? Pesquise abaixo no Google.


Para votar clique em quantas estrelas deseja para o artigo

RuimRegularBomMuito BomExcelente (Seja o primeiro a votar)
Loading...



Enviar postagem por email Enviar postagem por email


Últimos Comentários