Temor de violência marca preparativos para votação nos EUA
Tom agressivo da disputa presidencial é um dos fatores que explica apreensão de autoridades, ativistas e eleitores de ambos os partidos; pleito acontece na terça-feira.
Mesários em Denver, no Colorado, receberam um módulo extra no treinamento para as eleições deste ano: como reagir em caso de tiroteio. Na Pensilvânia, autoridades distribuíram uma cartilha lembrando que intimidar eleitores é ilegal. Em diversas cidades, as aulas serão canceladas em escolas onde há votação.
Ao fim de uma campanha marcada pela retórica agressiva, o temor de violência vem se manifestando nos preparativos para o pleito presidencial, que acontece nesta terça-feira (9). “Nos preparamos para qualquer tipo de situação”, disse à BBC Brasil a diretora de Eleições de Denver, Amber McReynolds.
No caso específico do Colorado, palco de tiroteios como o da escola Columbine, em 1999; o de um cinema, em 2012; e o de uma clínica de aborto, no ano passado, McReynolds ressalta que a medida estava prevista desde o ano passado e não tem relação direta com a campanha. “É mais por causa do clima que temos visto nos últimos anos, em todo o mundo”, afirma.
“Além do foco na possibilidade de tiroteio, (o treinamento) inclui dicas sobre situações que podem ocorrer em uma votação, desde falta de luz até emergências médicas, incêndios e desastres naturais”, acrescenta. Mas o tom da disputa presidencial tem causado aprensão em autoridades, ativistas e eleitores de ambos os partidos.
Segundo pesquisa do jornal USA Today e da Universidade Suffolk, 51% dos eleitores se dizem preocupados com a possibilidade de violência no pleito. “Não estamos necessariamente prevendo violência, mas é inteiramente possível”, disse à BBC Brasil o especialista em extremismo Mark Potok, do Southern Poverty Law Center, organização que monitora grupos radicais no país.
Fraude
Potok e outros críticos citam declarações do candidato republicano, o empresário Donald Trump, como motivo de preocupação. Trump alertou repetidas vezes para o risco de fraude, disse que há uma conspiração da mídia e do governo contra ele, convocou seus eleitores a monitorarem locais de votação e se recusou a dizer se respeitará o resultado caso sua adversária, a democrata Hillary Clinton, saia vitoriosa.
A possibilidade de fraude é amplamente rejeitada por especialistas e estudos. Uma análise realizada por um professor da Loyola Law School, em Los Angeles, com base em mais de 1 bilhão de votos entre 2000 e 2014 revelou apenas 31 casos. Nessas eleições (já iniciadas em vários Estados que permitem votação antecipada), o único episódio envolveu uma eleitora do próprio Trump, presa em Iowa por tentar votar duas vezes.
Mesmo assim, segundo a pesquisa do USA Today, mais de 40% dos eleitores de Trump dizem que não vão reconhecer a legitimidade de Clinton como presidente, caso ela seja eleita, por acreditarem que a eleição não será justa.
Grupos que apoiam o republicano, alguns ligados a movimentos nacionalistas, neonazistas e à Ku Klux Klan (grupo supremacista branco), já anunciaram que vão se mobilizar para monitorar a votação. O Oath Keepers, que reúne ex-policiais e militares, lançou um comunicado em que convoca seus membros a “formar equipes incógnitas para coletar inteligência e monitorar a ocorrência de crimes” no dia da eleição.
“Pedimos que não tentem interromper a atividade criminosa suspeita ou confrontar aqueles que estão cometendo (a irregularidade). Simplesmente identifique, documente e reporte às autoridades”, orienta o grupo.
Observadores
Democratas entraram com ações em quatro Estados acusando o Partido Republicano de tentar impedir minorias (tradicionalmente favoráveis ao Partido Democrata) de votar.
Os locais de votação já têm tradicionalmente a presença de observadores credenciados e treinados pelos partidos, que acompanham votação e apuração para detectar e impedir fraudes. Em alguns casos, há também monitores do governo ou observadores internacionais.
A possível presença de monitores “informais” provoca o temor de que negros e outras minorias acabem intimidados e desistam de votar.
Em alguns Estados, a situação é agravada por novas leis eleitorais com exigências mais rígidas de identificação que, segundo críticos, afetam desproporcionalmente essa parcela do eleitorado.
Com mudanças na Lei do Direito ao Voto de 1965, aprovadas pela Suprema Corte em 2013, o governo terá de reduzir o número de observadores oficiais que costumava deslocar para áreas com histórico de discriminação racial. Neste ano, eles serão enviados a apenas cinco Estados.
A Leadership Conference on Civil and Human Rights, coalizão que reúne mais de 200 organizações de defesa dos direitos humanos e civis, enviou cartas a autoridades eleitorais de todos os Estados citando preocupações com o que define como “tempestade perfeita” para intimidação e discriminação de eleitores.
Ataques
Contribui para a tensão o fato de a maioria dos Estados permitir que eleitores votem portando armas, além de ataques recentes ligados à eleição. No mês passado, um escritório do Partido Republicano na Carolina do Norte foi alvo de um incêndio criminoso. Nas paredes, foi escrita a frase “Republicanos nazistas, deixem a cidade ou vão aprender”. Nesta semana, uma igreja no Mississippi, de maioria negra, também foi incendiada propositalmente, com a frase “Vote em Trump” escrita em uma parede.
Há ainda a preocupação com a possibilidade de ataques de hackers. Até agora, 46 Estados já pediram ao Departamento de Segurança Interna ajuda para proteger seus sistemas eleitorais.
Presença internacional
Diante desse cenário, é grande o número de observadores internacionais acompanhando as eleições. A Organização para a Segurança e Cooperação na Europa (OSCE) participa com 426 observadores. Em 2012, foram 44.
A Organização dos Estados Americanos (OEA) tem 41 especialistas. Segundo a chefe da missão, a ex-presidente da Costa Rica Laura Chinchilla, o objetivo é “aprender sobre práticas que possam ser compartilhadas com outros Estados membros e oferecer recomendações ao país anfitrião”.
Ao contrário dos monitores do governo e dos partidos, esses observadores não interferem no processo eleitoral. Sua missão é observar aspectos como tecnologia, financiamento, papel da mídia e participação e verificar se as eleições seguem padrões internacionais.
Incentivada pelo governo federal, sua presença precisa ser autorizada pelas autoridades estaduais. Em 12 Estados, é proibida. Nas últimas eleições, integrantes da OSCE chegaram a ser ameaçados de prisão no Texas, após serem confundidos com membros da ONU.
Apesar de estarem preparados e alertas para a possibilidade de problemas, especialistas esperam que as eleições transcorram normalmente.
“Quando falo na possibilidade de violência, estou me referindo a casos isolados. Certamente não vamos ver multidões brigando ou algo assim”, afirma Potok.
Fonte: Último Segundo/Mundo/BBC BRASIL
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